O Som do quebra-queixo

Pesquisar sobre sons é algo que me instiga e um dos motivos é o fato de que ao mesmo tempo que as pessoas mostram desatenção ao ambiente sonoro todos também carregam na sua memória a presença especial de um som que remete a motivos diversos. Por inúmeras vezes ao começar a dialogar sobre paisagem sonora com alguém recebo exemplos de memórias sonoras que por vezes a própria pessoa não se dava de conta até refletir sobre ela.
Certa vez, entre os tantos episódios que presenciei, fui conversar com uma colega afim de pedir uma ajuda na pesquisa sobre sons. Ela trabalhava no núcleo de pesquisa de uma faculdade e eu estava querendo desenvolver um questionário para aplicar na rua. Ela é uma pessoa bem séria, então eu fui com um discurso bem sereno, sem muitas filosofias poéticas, esperando pouco entusiasmo, contando com  ajuda pela amizade. Tentando ser direto na conversa  fui indagando sobre um perfil de perguntas e a inicio, como ela não tinha apanhado o espírito da proposta, conduziu um raciocínio altomático sobre que sons existe em determinado ambiente e coisas parecidas. Porém quando o mínimo de reflexão foi exigido para pensar na pergunta que lancei: "Que sons remetem a sua infância?"; fui surpreendido por um leve brilho nos seus olhos seguido de um testemunho espontâneo e saudoso.
Ela me contou que sentia falta do som do vendedor de quebra-queixo( um tipo de doce de coco). Achei que era por algum tipo de chamado que ele pra fazia atrair fregueses  mas na verdade o som que a fez voltar no seu passado era o ruido que ele produzia ao embalar o doce pois ele andava na rua com uma bandeija e a massa de doce espalhada por cima, vendendo a granel, quando alguém lhe comprava um quebra-queixo, ele pegava uma espátula de metal, tirava um pedaço do doce colocava em um pedaço de plástico ou papel, e o som era justamente o contato entre a espátula e a bandeija. Eu não conhecia. Ela não esquecia. Mesmo sem lembrar, ela nunca deixou de ouvi-lo.


Thiago Nascimento

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